domingo, 20 de março de 2011

Os cinco pinicos de ouro



Antes que alguém fale que o certo é PENICO, escolhi como é falado, penico é muito estranho. E afinal, as pessoas fazem a linguagem.  Bem vamos à crônica.

Passos apressados são escutados pela casa.
                - Roubaram a casa!
                -O que foi Dona Margareth?
                -Dr. Mauro, roubaram um dos cinco pinicos de ouro.
                Mauro Mey, Dr. em otorrinolaringologia, era de família rica e possuía cinco pinicos de ouro. Herança de seu tataravô Eustáquio, que tinha preguiça de ir ao banheiro no meio da noite.Mauro, particularmente, não gostava dos pinicos, mas sua mulher Lavínia fazia questão de tê-los. Quando acontecia alguma festa na casa, chamava todos os convidados, mostrava os pinicos e dizia em tom de orgulho:
                - Muitas gerações da família Mey já defecaram nesses pinicos.
                Geralmente fazia isso depois do jantar; perdeu muitos amigos.
                Agora uma dessas relíquias dourada havia sido roubada.
                - Como isso pode ter acontecido?- perguntava Mauro.
                -Não sei. Cheguei aqui para espaná-los e notei que estava faltando um.
                -Não deixe Lavínia escutar.
                - Não vai dizer que um dos pinicos foi roubado?
                - O quê?! Roubado?!
                Lavínia acabara de entrar.
                - A nossa herança- exasperava-se. – Rápido, chamem a polícia.
                - Bem, Dona Lavínia, tomei a liberdade de chamar um detetive. Acabei de ligar.
                - Fez bem Margareth.
                Depois de meia hora aproximadamente, chega o detetive.
                - Boa tarde, sou o detetive Não Sei o Nome e este é meu amigo Matou o Ócio.
                - Boa Tarde. Eu e minha mulher estamos aflitos.
                - Contem-me o que aconteceu. Mas antes, quero fazer algumas observações. Vejo que o senhor é otorrinolaringologista, foi boxeador na juventude e comeu camarão no jantar de ontem.
                - Como o senhor descobriu isso?- espantava-se Mauro.
                - Simples. Minha irmã já se consultou com o senhor, vi o troféu de um campeonato de boxe ali atrás com o seu nome e data de quando era jovem. A comida identifiquei pelo cheiro do pum que soltou agora a pouco.         
                - Pensei que viesse dos pinicos.
                Olhe que meus pinicos são muito bem limpos, Matou o Ócio. - irritava-se Lavínia.
                - Contem-me agora o que aconteceu.
                Margareth, a empregada, contou toda a história. Depois de ouvi-la, o detetive e seu amigo foram ver o local do crime. Observou os quatro pinicos e o local em que ficava o que fora roubado.
                Voltando a sala de estar, Não Sei o Nome tinha algumas perguntas a fazer.
                - Dona Margareth, notou algo de estranho durante a noite?
                - Acho que não.
                - Nenhum barulho?
                - Ah sim. Lembro de ter ouvido algo parecido com água sendo derramada.
                - Portas e janelas estavam fechadas?
                - sim, estavam.
                - Sra. Mey, quantas pessoas moram nesta casa?
                - Somos eu, meu marido e nossa empregada Margareth, os outros passam apenas o dia.
                Não Sei o Nome meditou por alguns instantes.
                - Já descobriu o ladrão, Matou o Ócio?
                - Não consigo ver a solução.
                - Eu já. Quem roubou o seu pinico  Sra. Mey, foi a Srta. Margareth.
                - O quê? Eu? Não foi mesmo!- exaltava-se a empregada.
                -  Foi sim.- continuava a afirmar o detetive.- Foi você quem ligou para mim, isso para não levantar suspeitas. A história do barulho de água era só para despistar. A Srta. Estava precisando de dinheiro; tendo os pinicos sempre perto, a ambição falou mais alto, então inventou aquela história toda. A Srta. é a única empregada da casa, não havendo sinal de arrombamento...Confesse.
                - De maneira alguma! Quem roubou o pinico...roubar não,pegar...foi o Dr. Mauro.
                - O quê?! Está acusando meu marido?!
                - Querem ver? Primeiro, ele não queria que eu avisasse do sumiço do pinico; apesar de não gostar muito dessa herança de seu tataravô, estava muito nervoso e, pelo cheiro do pum que soltou, certamente está com diarréia.
                Nesse momento, dona Margareth se levantou e foi em direção a cena do crime, voltando com algo na mão.
                - Eis aqui a prova que confirma minha acusação. – continuou ela. – Um botão do pijama do Dr. Mauro, estava perto dos pinicos. Não sei como essa prova lhe escapou Não Sei o Nome.
                O detetive olhou-a com certo constrangimento.
                - O Dr. provavelmente não se sentia bem e acordou no meio da noite para ir ao banheiro. Não conseguindo chegar lá, fez o “serviço” em um dos pinicos. Foi esse o som de água derramando que escutei. Após deve ter escondido o pinico. Pela manhã, iria limpá-lo e colocá-lo no lugar, como descobri o desaparecimento e chamei um detetive, teve que continuar calado.
                - Foi isso que aconteceu querido?- perguntava Lavínia.
                - Bem, querida, deve ter sido aquele camarão de ontem... Não pude agüentar.
                - Mas por que não me disse?
                - É que pensei que ficaria brava.
                - Querido, você é um Mey. Pode defecar quantas vezes quiser nos pinicos. Não Sei o Nome, você é um péssimo detetive. Quase incriminou a Margareth.
                - Os indícios estavam contra...
                - Não conseguiu terminar a frase, pois se lembrou do show de inteligência de Margareth.
                - Tudo está resolvido, mas afinal, onde está o pinico?- perguntou Matou o Ócio.
                - Eu o coloquei na lata de lixo.
                - Por isso que o lixo fedia tanto... Mas esperem, estão escutando? O caminhão do lixo está saindo. E com o pinico!
                - A herança da família! Parem aquele caminhão! – alterava-se Lavínia.
                Todos saíram correndo atrás do caminhão e Lavínia gritava:
- Parem, quero o meu pinico!

terça-feira, 8 de março de 2011

A mulata de Seu Arlindo



                Festa de carnaval em casa é sempre aquilo: alegria, som alto, bebidas e a casa toda destruída. Primos, sogra, tios, tias, afilhados sempre por ali, cunhado, um vizinho bêbado que vomita no sofá, um garoto que você não sabe quem é e depois vem descobrir que é um dos afilhados, a cunhada que só vai pra falar mal de você, sem esquecer daquele cara que está no sofá, com o vômito do vizinho, na quarta-feira de cinzas e você não sabe quem é.
                Não estava sendo diferente na casa de Seu Arlindo. Todo ano reunia família e adjacentes e fazia a festa. Era terça-feira, a casa já estava destruída, mas a alegria é que importava. Naquele instante entra, como que trazendo uma escola de samba inteira, uma mulata que já chega sambando. Não qualquer mulata, mas daquelas que parecem já vir com o carimbo: ”Made in Rio de Janeiro”. Sambando, sambando e chegando perto de Seu Arlindo. Dona Miriam, mulher de Seu Arlindo, quando vê aquilo vai logo tomar satisfações. A mulher, que dizer que se assemelha a um peixe-boi não chega a ser um eufemismo, vermelha e eufórica já grita:
                -Quem é essa mulata, Arlindo? Dou cinco segundos pra explicar.
                -Não tenho idéia.
                Falava a verdade, estava tão atônito quanto à esposa. De onde viera aquele mulherão, se questionava.
                -Como pode não se lembrar de mim Lindinho. Sandra, a sua rainha da bateria.
                O homem não entendia, estava confuso e com medo da mulher que já se preparava para o ataque.
                -Após os desfiles das escolas de samba do Rio ano passado. -continuou Sandra.
                O mais curioso é que a mulata contava a história, mas não parava de sambar. Parecia estar no automático.
                -Seu cachorro, você não foi visitar sua tia doente ano passado. Foi pra farra.
Tinha ido visitar a tia doente, mas aproveitou para ir ver as escolas de samba do Rio. Lembrava que estava no sambódromo, mas só isso. Havia bebido demais, esquecera todo o resto.
                Vendo todo aquele alvoroço, o irmão de Miriram tentou intervir:
                - E aí, mulata. Trouxe tudo ou deixou alguma coisa em casa.
                Miriam avançou contra Sandra.               
                -Aguarda Arlindo, quando eu terminar com ela o próximo será você.
                Seu Arlindo e alguns parentes tentaram segurar a criatura. A força dela estava fora do comum, foi preciso cinco pessoas para segura-la. O irmão de Miriram também tentou ajudar, mas de um modo estranho, pois segurava Sandra. Porém a passista não estava avançando contra ninguém.
                -Me solta seu tarado.
                Após muitos minutos, domaram a mulher.
                Levaram-na para o quarto. A irmã foi junto, oportunidade única de falar mal do cunhado. Miriam foi aos prantos. E Seu Arlindo ficara ali, desnorteado e pensativo. Nunca mais beberia tanto no carnaval, refletia. Como poderia ter esquecido de tal mulata. Por fim, levantou-se, olhou para Sandra, que continuava sambando, e concluiu: ”afinal, hoje é carnaval”. Chegou perto da mulata, disse-lhe duas palavras e saiu sambando pela sala.                                                                                                                                                                                               
PS.: Os palavrões de Dona Miriam foram omitidos para preservar a integridade da crônica.                                      


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